Enfrentar dificuldades financeiras é um risco sempre presente no mundo empresarial. Seja qual for o ramo em que atue, seu porte ou grau de experiência no mercado, é comum que os empreendimentos em algum momento passem por turbulências que acabam por ameaçar a continuidade do negócio. Afinal, não são poucos os fatores que podem afetar direta ou indiretamente as operações de uma empresa, levando-a muitas vezes a entrar em situações de endividamento.
Em alguns casos, essas dificuldades podem se agravar, levando as empresas a buscarem soluções para tentar se reerguer ou, caso verificada a condição de insolvência (na qual os ativos da organização são insuficientes para honrar suas dívidas), encerrar suas atividades. Em cenários como esses, dois termos muito discutidos no direito empresarial emergem: a recuperação judicial e a falência. Embora ambos envolvam empresas em crise, eles têm propósitos, procedimentos e consequências bem diferentes.
No artigo de hoje, vamos esclarecer as diferenças entre esses dois institutos que, desde janeiro de 2021, estão regulamentados na Lei nº 14.112/20, conhecida como nova lei de falências, que atualizou as regras referentes à recuperação judicial, à recuperação extrajudicial e à falência do empresário e da sociedade empresária. Continue a leitura e entenda como cada um desses processos funciona na prática.
O que é recuperação judicial?
A recuperação judicial é um procedimento legal originalmente regulamentado pela Lei nº 11.101/2005 (Lei de Falências e Recuperação de Empresas) que visa à recuperação de empresas em crise. Ela oferece uma oportunidade para que a empresa se reorganize financeiramente e continue suas atividades, ao invés de encerrar suas operações de imediato.
Nesse processo, são adotadas medidas para reorganizar a empresa no plano econômico, operacional, administrativo e financeiro, tendo o Poder Judiciário como intermediário. A ideia não é apenas ajudar os donos do empreendimento em dificuldades, mas também preservar a companhia no contexto da economia e a função social que ela desempenha junto a seus funcionários e suas famílias. Ou seja, evitar que trabalhadores fiquem sem emprego, que fornecedores percam um cliente, consumidores fiquem sem um serviço ou produto, além de privar o poder público de uma fonte de arrecadação.
Versão moderna da antiga concordata, a recuperação judicial começa com um pedido da própria empresa que passa por dificuldades. Seu principal foco é evitar a falência da empresa, que ganha um fôlego com a suspensão temporária de cobranças, para que ela elabore um plano de recuperação que deverá ser aprovado pelos credores e homologado pelo juiz do processo. Durante esse período, a empresa busca renegociar suas dívidas, cortar custos e, se necessário, reformular sua operação.
Aprovado pelos credores e homologado pelo juiz, o pedido de recuperação judicial, prevalecem as seguintes consequências e garantias:
- Suspensão do curso da prescrição das obrigações do devedor;
- Suspensão das execuções ajuizadas contra o devedor relativas a créditos ou obrigações sujeitas à recuperação judicial ou à falência;
- Proibição de qualquer forma de retenção, arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre os bens do devedor cujos créditos ou obrigações se sujeitem à recuperação judicial ou à falência.
Vale destacar que a recuperação judicial não é uma etapa indispensável para a falência. Isso porque, se a empresa devedora não entrar com o pedido de recuperação judicial, seus credores poderão entrar diretamente com o pedido de falência.
Principais aspectos da recuperação judicial
- Continuidade das atividades: a empresa continua operando enquanto tenta reestruturar suas finanças.
- Plano de recuperação: a empresa deve apresentar um plano detalhado para pagamento das dívidas, o qual será analisado e votado pelos credores.
- Prazos e negociação: o plano pode incluir alongamento de prazos, descontos nas dívidas (deságios) e outras formas de negociação.
- Suspensão de ações: a partir da aceitação do pedido de recuperação judicial, as execuções movidas contra a empresa ficam suspensas por 180 dias (período de “stay period”).
- Participação dos credores: os credores têm um papel ativo, participando das assembleias para discutir e aprovar o plano de recuperação.
- Gestão da empresa: a gestão da empresa pode continuar com os mesmos administradores, mas sob fiscalização de um administrador judicial nomeado pelo juiz.
O que é falência?
Regulamentada pela mesma legislação da recuperação judicial, a falência ocorre quando a empresa não consegue se recuperar financeiramente e a única solução é o encerramento de suas atividades. A falência é decretada quando a empresa não é mais viável economicamente, ou seja, quando não há perspectivas de recuperação, ou quando seus ativos não são suficientes para quitar suas dívidas.
Ao contrário da recuperação judicial, onde a empresa tenta se reorganizar, a falência tem como objetivo liquidar o patrimônio da empresa para pagar os credores na medida do possível. O processo é conduzido por um administrador judicial, que promove a venda dos ativos da empresa e distribui o valor arrecadado entre os credores de acordo com a ordem de preferência estabelecida pela lei.
No processo de falência, os ativos da empresa são liquidados e postos à venda para pagar os credores segundo uma ordem prevista na lei. Nessa ordem, os funcionários também têm direitos a receber, incluindo créditos trabalhistas, férias e 13º salário.
Ordem de preferência para receber
Decretada a falência, a preferência para receber segue a seguinte ordem, conforme a origem da dívida:
– Créditos derivados da legislação trabalhista, limitados a até 150 salários mínimos por credor e aqueles decorrentes de acidentes de trabalho
– Créditos gravados com direito real de garantia até o limite do valor do bem gravado, como imóveis
– Créditos tributários, independentemente de sua natureza e do tempo de constituição, exceto os créditos extraconcursais e as multas tributárias.
– Créditos quirografários e demais créditos.
A lógica dessa ordem de prioridade é garantir que empregados e o governo fiquem em posição privilegiada. Fornecedores costumam ficar no final da fila e com frequência acabam sem receber nada da empresa falida.
Aspectos da falência
- Encerramento das atividades: com a falência decretada, a empresa encerra suas operações.
- Liquidação dos bens: o administrador judicial liquida os bens da empresa (imóveis, equipamentos, estoques) para pagar as dívidas.
- Pagamento dos credores: o pagamento das dívidas segue uma ordem de prioridade em que os créditos trabalhistas têm preferência, seguidos por créditos com garantia real, tributários e quirografários (sem garantia).
- Extinção da empresa: após o processo de falência, a empresa é extinta e seu CNPJ é encerrado.
Principais diferenças entre recuperação judicial e falência
Embora ambos os processos envolvam crises financeiras, existem alguns aspectos fundamentais que os distinguem. Confira a seguir:
- Objetivo: a recuperação judicial busca salvar a empresa, enquanto a falência visa sua liquidação e encerramento das atividades.
- Continuidade das atividades: na recuperação judicial, a empresa continua funcionando enquanto tenta se reorganizar. Na falência, as atividades são encerradas.
- Gestão: na recuperação judicial, a administração da empresa permanece com seus gestores, sob supervisão judicial. Na falência, a gestão é retirada da empresa e passa a ser conduzida por um administrador judicial.
- Participação dos credores: na recuperação judicial, os credores têm um papel ativo, votando o plano de recuperação. Na falência, os credores apenas aguardam a distribuição dos recursos.
- Consequências para a empresa: na recuperação judicial, o objetivo é reestruturar e manter a empresa em operação. Na falência, a empresa é liquidada e extinta.
Regras e procedimentos de cada processo
Recuperação Judicial
– A empresa deve apresentar uma prova de viabilidade econômica.
– A solicitação de recuperação deve ser feita por meio de um pedido ao juiz, que pode aceitar ou não.
– O plano de recuperação deve ser apresentado no prazo improrrogável de 60 dias após da publicação da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial e precisa ser aprovado pelos credores.
– Se o plano for aprovado e cumprido, a empresa pode sair da recuperação judicial e continuar operando.
Falência
– A falência pode ser requerida pelos credores ou pela própria empresa, quando não vê mais condições de continuar suas atividades. A falência também pode ser decretada pelo juiz durante o processo de recuperação judicial verificadas as hipóteses legais.
– O juiz decreta a falência e promove o afastamento do devedor de suas atividades, nomeando um administrador judicial.
– O administrador judicial fará a liquidação dos ativos da empresa e a distribuição dos valores arrecadados entre os credores.
– Após o processo, a empresa é extinta e o CNPJ é encerrado.
O que é a recuperação extrajudicial?
A recuperação extrajudicial busca os mesmos objetivos de recuperação, com base em um procedimento acordado com credores e que se desenvolve no âmbito das empresas. O procedimento tem início com a apresentação de uma proposta de reestruturação das dívidas aos credores da companhia em dificuldades.
Na sequência, os termos do acordo devem ser debatidos e aprovados em uma assembleia constituída pelas partes interessadas. Ao final, o plano de recuperação extrajudicial aprovado pelos credores sujeitos ao plano deve ser homologado pelo Juiz.
Quando optar pela recuperação judicial ou pela falência?
A decisão de entrar com um pedido de recuperação judicial ou de declarar a falência deve ser analisada com cuidado. A recuperação judicial é uma opção quando ainda há possibilidades concretas de reorganização e de continuidade das atividades da empresa. Já a falência é o último recurso, quando a empresa não tem mais condições de se reerguer.
Empresas que optam pela recuperação judicial podem evitar a falência, preservando empregos, relações comerciais e a continuidade dos negócios. No entanto, é preciso apresentar um plano de recuperação viável, com o apoio de uma consultoria especializada, para que a empresa tenha chances reais de sucesso.
Em resumo, a recuperação judicial e a falência são mecanismos legais para lidar com crises financeiras empresariais, cada um com características e objetivos específicos. Enquanto a recuperação judicial oferece uma oportunidade de reorganização e continuidade das operações, a falência significa o fim das atividades e a liquidação do patrimônio da empresa.
Entender as diferenças entre esses processos é essencial para que empresários e gestores que enfrentam dificuldades financeiras tenham subsídios para escolher a melhor estratégia para superar a crise ou encerrar as atividades de forma ordenada.
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